SUMÁRIO: REPRESENTAÇÃO. FRAUDE À LICITAÇÃO.
APRESENTAÇÃO DE DECLARAÇÃO FALSA QUANTO À APTIDÃO PARA RECEBER OS BENEFÍCIOS PREVISTOS NA LEI COMPLEMENTAR 123/2006. VALOR DOS CONTRATOS CELEBRADOS COM A ADMINISTRAÇÃO ACIMA DO PERMITIDO NA LEI 14.133/2021. NÃO ACOLHIMENTO DAS RAZÕES DE JUSTIFICATIVA. INIDONEIDADE.
RELATÓRIO
Adoto, como relatório, instrução elaborada no âmbito da Unidade de Auditoria Especializada em Contratações (AudContatações):
A. Identificação do Processo
TC | 028.945/2024-7 |
Status | Conhecimento, mérito: procedência, declaração de idoneidade e arquivamento |
Unidade Jurisdicionada | Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento dos Municípios do Centro Oeste do Tocantins – CMCO (CNPJ: 22.403.111/0001-81 e UASG: 464433) |
Representante | Forza Distribuidora de Máquinas Ltda (CNPJ: 46.135.499/0001-45) |
Objeto da Contratação | Aquisição de equipamento para implantação de uma usina de asfalto para atender os municípios integrantes do CMCO-TO |
Modalidade | Pregão Eletrônico para Registro de Preços – PE 1/2024 |
Valor Estimado | R$ 923.333,33 |
Legislação | Lei 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações) |
Fase do Certame | O certame foi cancelado, bem como todos os atos dele decorrentes. |
B. Identificação dos Responsáveis
Responsável | Certo Brasil Distribuidora Ltda, CNPJ 54.807.914/0001-98 |
Representante Legal | Emerson Oliveira Guimarães |
C. Histórico
- Trata-se de representação formulada pela empresa Forza Distribuidora Ltda. acerca de supostas irregularidades ocorridas no âmbito do Pregão Eletrônico (PE) 1/2024, promovido pelo Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento dos Municípios do Centro Oeste do Tocantins (CMCO), cujo objeto consistia na aquisição de equipamento para implantação de uma usina de asfalto, com valor estimado de R$ 923.333,33.
- A principal irregularidade apontada refere-se à participação da empresa Certo Brasil Distribuidora Ltda. no certame, sob a condição de Empresa de Pequeno Porte (EPP), mediante apresentação de declaração de enquadramento, quando, segundo alegado, a referida empresa teria celebrado, no ano-calendário de 2024, contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolavam o limite de receita bruta máxima admitida para o enquadramento.
- O representante sustentou que tal conduta caracterizaria fraude à licitação e requereu, cautelarmente, a suspensão do certame e a declaração de inidoneidade da empresa.
- A unidade de auditoria do TCU propôs o conhecimento da representação e a realização de oitiva prévia.
- O Ministro Relator deferiu medida cautelar, determinando a suspensão do andamento do PE 1/2024 até ulterior decisão de mérito. Além disso, determinou a realização de audiência da empresa Certo Brasil.
F. Exame Técnico
Item 1: Apresentação de declaração de enquadramento como Empresa de Pequeno Porte (EPP) em certame licitatório, em desconformidade com o limite de receita bruta previsto na legislação.
Conduta do responsável: a empresa Certo Brasil apresentou declaração de enquadramento como EPP para fins de participação no PE 1/2024, mesmo após ter celebrado, no ano-calendário de 2024, contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolavam o limite de receita bruta máxima admitida.
Razões de justificativa do responsável:
- A empresa alega que, na data da participação no certame (18/12/2024), estava regularmente enquadrada como EPP, pois a receita bruta efetivamente recebida (regime de caixa) até aquela data (R$ 4.404.199,00) não teria ultrapassado o limite legal de R$ 4.800.000,00.
- Sustenta que para fins de enquadramento, deve ser considerado apenas o valor efetivamente recebido (regime de caixa), e não o valor total dos contratos celebrados (regime de competência).
- Argumenta que não foi beneficiada pela preferência de EPP, pois sua classificação decorreu da desclassificação da primeira colocada.
- Alega que o contrato com o Município de Catalão/GO foi cancelado e não deveria ser computado.
Análise Técnica:
As razões de justificativa não foram válidas para afastar a irregularidade. A análise do enquadramento como EPP deve ser realizada com base na receita bruta apurada pelo regime de competência, e não pelo regime de caixa.
Foi realizada uma análise detalhada dos contratos celebrados pela empresa em 2024:
N | Órgão/Entidade Contratante | Data de Assinatura | Valor do Contrato (R$) |
---|---|---|---|
1 | Município de Itacajá/TO | 4/6/2024 | 523.000,00 |
2 | Município de Colmeia/TO | 20/6/2024 | 499.489,00 |
3 | Município de Catalão/GO | 27/6/2024 | 0 (Cancelado) |
4 | Vitória de Santo Antão/PE | 2/7/2024 | 489.000,00 |
5 | Mira Estrela/SP | 5/7/2024 | 569.900,00 |
6 | Tribunal de Justiça do Estado de GO | 15/7/2024 | 1.260.000,00 |
7 | Maurilândia do Tocantins/TO | 17/7/2024 | 576.666,00 |
8 | Alenquer/PA | 23/7/2024 | 530.000,00 |
9 | Restinga/SP | 9/8/2024 | 567.299,00 |
10 | Atalaia/PR | 13/8/2024 | 424.000,00 |
11 | Pedro Afonso/TO | 10/9/2024 | 469.000,00 |
12 | Baraúna/PB | 20/9/2024 | 530.000,00 |
13 | Cachoeira/BA | 24/9/2024 | 619.500,00 |
14 | Santo Antônio das Missões/RS | 21/10/2024 | 663.000,00 |
Total | Receita Bruta (Regime de Competência) | R$ 7.221.854,00 |
A tabela demonstra que, desconsiderando o contrato cancelado, a soma dos contratos firmados em 2024 totaliza R$ 7.221.854,00, valor que ultrapassa significativamente o limite de R$ 4.800.000,00 para enquadramento como EPP.
A legislação vigente e a jurisprudência do TCU são uníssonas ao determinar que a receita bruta para fins de enquadramento deve ser apurada pelo regime de competência. A mera apresentação de declaração falsa já configura fraude à licitação, independentemente da obtenção de benefício.
A mera participação de licitante como microempresa ou empresa de pequeno porte, amparada por declaração com conteúdo falso, configura fraude à licitação, ensejando, por consequência, aplicação da penalidade do art. 46 da Lei 8.443/1992, não sendo necessário, para a configuração do ilícito, que a autora da fraude obtenha a vantagem esperada.
Acórdão 1.483/2024-TCU-Plenário
Apesar do cancelamento do pregão, a representação não perdeu seu objeto, pois a apuração da conduta da empresa permanece necessária.
G. Conclusão
A unidade técnica propôs o conhecimento da representação, o julgamento pela sua procedência, a rejeição das razões de justificativa e a declaração de inidoneidade da empresa Certo Brasil Distribuidora Ltda.
VOTO
Trata-se de representação sobre possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico 1/2024, do CMCO-TO. A irregularidade consiste na apresentação de declaração falsa de condição de EPP pela empresa Certo Brasil Distribuidora Ltda.
A empresa alegou que deveria ser considerado o regime de caixa (receita recebida), que totalizaria R$ 4.404.199,00, abaixo do limite legal. Contudo, o art. 4º, § 2º, da Lei 14.133/2021 e a Lei Complementar 123/2006 estabelecem o regime de competência, baseado no valor total dos contratos celebrados.
A análise dos contratos da Certo Brasil em 2024 demonstra uma soma de R$ 7.221.854,00, valor significativamente acima do limite de R$ 4.800.000,00. Assim, restou confirmada a grave irregularidade na conduta da empresa, que prestou declaração falsa.
Nos termos da jurisprudência do TCU, o ilícito de fraude à licitação se consuma com a indevida participação no certame, independentemente de benefício. A ausência de obtenção de vantagem pode ser considerada apenas como atenuante na dosimetria da pena.
Por todo o exposto, julgo a representação procedente e aplico à Certo Brasil Distribuidora Ltda. a penalidade de inidoneidade prevista no artigo 46 da Lei 8.443/1992, pelo prazo de 1 (um) ano.
ACÓRDÃO Nº 1970/2025 – TCU – Plenário
1. Processo nº: TC 028.945/2024-7
2. Grupo I – Classe de Assunto: VII – Representação
3. Interessado: Consorcio Intermunicipal de Desenvolvimento dos Municipios do Centro Oeste do Tocantins – Cmco (22.403.111/0001-81)
4. Responsável: Certo Brasil Distribuidora Ltda (54.807.914/0001-98)
5. Relator: Ministro Walton Alencar Rodrigues
6. Unidade Técnica: Unidade de Auditoria Especializada em Contratações (AudContatações)
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de representação acerca de possíveis irregularidades ocorridas no Pregão Eletrônico 1/2024, conduzido pelo Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento dos Municípios do Centro Oeste do Tocantins (CMCO-TO);
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em:
- conhecer da representação, para, no mérito, considerá-la procedente;
- revogar a cautelar ratificada por meio do Acórdão 201/2025-Plenário, por perda de objeto;
- declarar a inidoneidade da sociedade empresária Certo Brasil Distribuidora Ltda. para participar de licitação na Administração Pública Federal, pelo prazo de 1 (um) ano, nos termos do art. 46 da Lei 8.443/1992;
- dar ciência desta deliberação às partes;
- arquivar os presentes autos.